domingo, 29 de janeiro de 2017

Revalida 2016 (Parte 3) – Prova Prática

Para a prova pratica, eu não estudei tanto, confesso. Apenas revi meus próprios resumos que havia feito para a prova teórica e me preparei, ensaiando mentalmente, os diversos casos que poderiam ser abordados. Mentalmente?! Isso mesmo, mentalmente, pois o formato da prova pratica é totalmente diferente daquilo que vimos na teórica e envolve conhecimento médico e, principalmente, de teatro. Isso mesmo, de teatro. Penso que você, além de saber conduzir os casos, precisa ser um bom ator. Explico.


A prova pratica do Revalida segue os moldes de algumas provas práticas de residência médica, principalmente dos grandes programas brasileiros. São dois dias de exames e trata-se de uma prova que envolve simulações de atendimentos reais que pode envolver boneco, atores ou situações específicas. Na maioria das vezes são apenas atores. Tem um médico examinador que é o cara que vai te dar a nota e um câmera profissional que filmará todo o “atendimento”; essa filmagem serve para posteriores dúvidas quanto à nota, caso não concorde com a nota do examinador.

A inscrição

A inscrição iniciou as 11h da manhã e eu me inscrevi as 14h. Foi um grande erro pois o local da prova era escolhido no ato dessa segunda inscrição e, São Paulo, que é onde moro, esgotou todas as vagas em 20 minutos. Quando fui me inscrever só tinha Florianópolis, São Luiz e Porto Alegre (POA); fiquei com POA.

Porto Alegre, a cidade é bonita e as pessoas são bacanas. Tem umas loiras de tirar o fôlego

2 semanas antes da prova

Saiu o local e confirmação do certame depois de adiarem por quase um mês a data da prova. Caí num hospital militar, no horário da manhã. Odeio fazer qualquer coisa de manhã; preferia ter de fazer a tarde. Comprei minhas passagens para ir de bus. Não precisei reservar hotel porque um brother muito firmeza, que também faria a prova no mesmo local, conseguiu uma hospedagem gratuita num convento. Foi perfeito e meu único medo era de meu corpo pegar fogo ao adentrar no recinto.

5 dias para a prova

Viajei a POA de bus. No caminho, pelo fone de ouvido, ouvia os áudios que eu mesmo gravei com resumos daquilo que poderiam pedir. PS: A paisagem do Sul é simplesmente maravilhosa e fiquei encantado com Camboriú. Chego na cidade depois de 22h de viagem; estava podre de cansaço.

Cheguei na quinta a tarde em POA e me dirigi ao convento onde meu brother, André, já estava hospedado. La, fui extremamente bem recebido e, de cara, senti um clima amistoso e aconchegante. Me deram um quarto com banheiro privado com tudo o que eu precisava. Muito melhor do que qualquer hotel que já fiquei. As irmãs eram muito gentis e amistosas, durante todo o período fizeram de tudo para que nos sentíssemos bem à vontade. Nos serviam café da manhã, almoço e jantar e, se quiséssemos, ainda tinha o café da tarde. Me sentia em casa.

Hospital Militar de POA. 

No dia seguinte, pela manhã, fomos ao local da prova num Uber para medirmos a distância entre o convento e o hospital. Era perto, cerca de 20 minutos. Olhei o lugar, era enorme e já fui tentando entrar no clima.

Sexta, um dia antes da prova

16h15 - Estou escrevendo isso em tempo real. Amanhã é a prova. Eu nem sei o que fazer nesse momento, se vou estudar, se vou ver TV, se vou ver vídeos idiotas no You Tube.... Deveria estar estudando, mas estou aqui escrevendo; devo estar maluco. As pessoas estão me chamando no WhatsApp, mas vou ignorá-las. Não conseguiria teclar agora com ninguém. Queria ligar para minha filha.

Eu não aguento mais issooooooooo...👀

20h45 – Minha dúvida agora é se eu tomo ou não um calmante. Posso escolher entre Clonazepam ou Zopiclona (para dormir). Trouxe o pacote completo. Tenho medo de tomar e amanhecer alto (grogue) ao fazer merda na prova. Acho melhor tentar dormir.... Tem alguém batendo na porta do quarto, deve ser o André...

21h10 – Era o André, ele queria repassar algumas coisas, mas nem eu e ele conseguiu. Na verdade, não estou com bom pressentimento com essa prova de amanhã. Que Deus me ajude; ainda bem que estou num convento, acho que Ele vai ouvir. Tem o Inri Cristo, também, ele me ajudou na prova teórica.

Cara, acho melhor você falar diretamente com Deus

Domingo a tarde

Mano, que pânico. Fiz a prova. Nem sei o que escrever aqui nem por onde começar. Bom, vou tentar escrever o que aconteceu, ainda estou meio em pânico: Acordamos cedo e fomos para o hospital onde realizei o exame; cheguei lá com uma hora de antecedência e já corri para uma loja de conveniência ali perto para me entupir de café; foram vários copos. Meia hora antes do início, liberaram para subir ao andar onde a prova seria feita. Lá, tivemos que deixar toda e qualquer coisa que estivéssemos levando, desde celular até documentos que não fossem o RG. Só podia entrar com comida em embalagens transparentes. Feito. Depois disso, dividiram todos os participantes em turmas de 15 pessoas e colocaram-nos em uma salinha com 3 fiscais que nos explicou como seria:

- Nada de caneta.
- Somente o jaleco e estetoscópio, se fôssemos pegos com algo, era anulada imediatamente nossa participação.
- Teríamos 10 minutos para cada “atendimento”, nem um segundo a mais nem a menos.
- Não manter contato visual ou verbal com ninguém.
- Ao entrar na sala, ler o enunciado do caso. Ela explicou que dentro de cada sala há um impresso que devíamos ler, nesse impresso continha informações referente ao caso.
- Na sala teriam 3 pessoas, um ator, um câmera, que filmava tudo para posteriores dúvidas quanto a nota, e um médico examinador, que é o cara que te dá a nota.

Minha turma foi a primeira. Mano, que pânico!

O trem é bem sério. Fomos orientados a seguir uma das fiscais em fila indiana com a cabeça baixa (não podia manter contato visual com ninguém) até que fomos distribuídos 1 a 1 de frente a uma sala de avaliação; para cada candidato uma sala. Ficamos esperando o apito inicial, em pé, no corredor, com uma fiscal nos observando (sim, eles apitavam com um apito de verdade e, a partir dali, começava a contar 10 min).

Soa o apito, a fiscal abre a porta e entro no meu primeiro caso. Parece que ao adentrar naquela sala, meu cérebro ficou lá fora. Me tornei um completo burro. Esqueci tudo o que tinham me orientado (ler o enunciado) e fui direto ao atendimento. Era pediatria e uma atriz segurava um boneco no colo, simulando ser seu filho. Depois de iniciar o atendimento que lembrei do enunciado e fui ler no meio do atendimento. Ai que fui entender mais ou menos o que eles queriam.

O primeiro caso

A mãe trazia uma recém-nascido de dois ou três dias de vida com a queixa de que a criança estava estranha, molenga, não mamava direito... na mesa tinha outro impresso com a foto do bebê. A minha tarefa era olhar a foto e dar um diagnóstico. Era uma foto mal impressa, de péssima resolução e naquela hora não me veio nada a cabeça a não ser a Síndrome de Down e o Hipotireoidismo congênito. Aí a mãe me fez várias perguntas e eu enrolei como pude. Saí de lá tonto. Péssimo. Tirei 2,5 de 10.

Como eu me sentia na frente do examinador fazendo saporra de prova (tem um vidro na frente 😀)

Fui para a sala seguinte; a mesma coisa, sem contato visual e esperando o apito.

Os outros casos

Depois foi uma sutura. Muito fácil. Pergunta se fui bem!? Fui nada... estava nervoso, esqueci tudo o que sabia (e, modéstia à parte, estava bem preparado), mas fiquei muito nervoso (logo eu, o fabricante do rivotril). Não coloquei os campos estéreis, não fiz a anestesia direito, não dei o antibiótico, e dei uns pontos igual a minha cara! Um dos pontos escapou e outro rasgou. Tirei 3 de 10. Merecia menos.


O examinador estava rindo de mim. Eu podia sentir.

Depois foi um caso diferente. Eu era o médico de um banco de sangue e chegava uma senhora que havia sido chamada devido ao seu resultado ter dado alterado. Ela era HIV positivo e minha tarefa era interpretar o resultado e dar-lhe a notícia. Fui bem demais, fiz 10 pontos de 10 válidos!

Na sequência foi uma grávida de primeiro trimestre com queixa de dor de cabeça e na anamnese você tinha que descobrir que era um caso de suspeita de dengue. Tinha que definir a conduta (observação). Tirei 6.

Bom, para resumir, meu primeiro dia de prova foi péssimo. Acabamos os 5 casos do dia em pouco mais de uma hora, mas não podíamos ir embora porque tínhamos que esperar até que a turma da tarde entrasse. Ficamos dentro da salinha até as 14h.

Dentro da salinha, tinha uma menina colombiana em prantos. Ela chorava incoercivelmente. Ela disse que na hora da prova não conseguia nem falar e que travou completamente.   Outros pareciam tranquilos e no final todo mundo virou amigo. Até grupo de WhatsApp foi feito.
Eu sabia, eu estudei, eu apenas não consegui dizer nenhuma palavra.

Sai do hospital as 14 horas, não sentia fome, só tristeza. Estava inconformado em como tinha ido mal e como o INEP tinha colocado uma prova escrota daquelas. Na verdade, não estava difícil, mas foram situações bem atípicas e inesperadas.

No convento, as irmãs tentaram me animar, mas eu não conseguia fazer nada. Não sentia fome e só queria enterrar minha cara debaixo das cobertas e acordar somente quando o apocalipse zumbi tivesse começado.

Minha esperança era a segunda parte da prova prática, no domingo. Eu tinha que ir bem de todo jeito, caso contrário, by by CRM. Pois é, a ilusão de que a prova prática é facílima e que todos passam é uma grande armadilha. Essa prova foi foda, ao menos para mim

Meu corpo não pegou fogo.


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